domingo, 10 de abril de 2011

Em terra de cego

Depois de um dia cheio de trampo e no derradeiro dia naquela cidadezinha, ao sudeste. Sentamos eu e o fotografo no bar, uns amigos dele, gente da universidade, gente da cultura. De longe, com a miopia de sempre, eu avistei aquele homem grande e bonito. Uns oculos john lennon com lente cinza, fumaca. Um dos olhos, o esquerdo, era baixo. Mas ele nao deixava que o copo, meu ou de qualquer um, ficasse vazio. Gentileza. 
Algumas garrafas depois, trocamos de bar. O estabelecimento a diagonal fechava mais tarde e oferecia uns pasteizinhos. No caminho, um beijo. Firme, gostoso, super valido. Um pouco antes eu havia perguntado. Era um estudante? Nao, trabalhador. Definitivamente nao era um beijo preguicoso. E absolutamente nao era um beijo idilico. Era um beijo bom.
Era, mesmo, um cara caolho. Tive certeza sob a luz do segundo bar. Nem por isso, naturalmente, parei de beijar. Porque pra isso eu lidava com a boca e, pra bom observador, um olho basta. 
Levou um estilingue na cara do olho esuqerdo quando moleque, acidente de crianca, molecagem de primos. Coisa de menino que brinca com pau e pedra e mato e bicho. O olho avermelhou e inchou. Passarm folhas e caldos, rezaram. O olho embranqueceu e desinchou. Parecia normal. Mas, dois anos depois, com a cabeca nas pernas de uma tia, brincando com as pontas do cabelo dela, ele tampou o olho direito. E, entao, ele nao viu nada. Tudo se tornou preto.
Mas o doutor nem examina, chamando o pai de lado, lhe diz logo em surdina. Nao ha um so remedio em toda a medicina.
Trabalhava com construcao civil, ele disse. Se nao era engenheiro, devia ser pedreiro. Na cama com Marx, eu pensava. E ai ele me disse. Estudar vinte anos e trabalhar pros outros? Ele ralou muito tempo e, com um tio, abriria sua empresa. Aos 24 anos.
Ele nunca conversara tanto tempo sobre tantas coisas, com outra pessoa do sexo feminino, na mesma cama. Mesmo tendo namorado com tres garotas. Namoro sem sexo? Sexo sem conversa?
Eu ate quis filosofar. 
Mas acontece que eu brochei. De maneira irreparável. Ops.