Com tantos
clichês disponíveis na vida, na rede e além, fica difícil traçar uma linha de
pensamento íntima sobre a quintessência da cafajestagem. Mas para toda e
qualquer coisa existe a tal experiência pessoal. É claro – eu precisaria ainda
de muitos botões abertos e fechos-ecler arreganhados para me aventurar
(delícia) na feitura de uma brevíssima exposição de uma tipologia cafa. Pois
não resisto: sou afeita a classificações arbitrárias.
O ex-mai
cafa que dá título a esse texto foi quem inaugurou em mim o gosto e o horror
pela analítica da cafajestagem. Não foi o primeiro. Meu primeiro cafa foi,
miséria, meu primeiro amor. Eu tinha treze anos e ainda não trepava. Mas
escrevia umas poesias super quentes, com direito à versos sobre a descoberta
(imaginária) da felação. Ele acabou pegando minha melhor amiga no auge de minha
paixão. Retrospectivamente, percebo que ele era um cafa mirim. Ascendeu na
cafajestagem uns três anos depois. Aí eu já havia embarcado em outra canoa
furada. Cafa típico. Nem bonitinho, nem ordinário. Eu tinha dezesseis anos e só
pensava em trepar. Ele também, tanto que mantinha três namoradas – sendo eu
parte da tríplice – e uma dúzia de amantes. Skatista, usava corrente prateada
no pescoço, piercing e era magro qual vara de bambu. Eu achava esse skatista o
máximo da rebeldia, fiquei pirada. Fiquei pirada uns quatro anos, na verdade.
Continuo a buscar, em vão, uma explicação para o tanto de tesão que eu tinha
naquele moleque. Só o pau torto não é capaz de dar sentido às horas seguidas
que passávamos dentro do Uno fodido do pai dele, no meio do mato, queimando
toda aquela pólvora adolescente. Queimando outras coisas também.
Chamo o
skatista de cafa típico porque, além de ter me enrolado por anos com muito sexo
e até umas promessinhas de amor, ele sempre foi convicto de sua cafajestagem. E
ainda por cima, queria mudar. Nos meus ínterins de lucidez, quando decidia dar
uma basta naquela punhetagem dos infernos e ir quarar em outros varais, ele
abria o berreiro em choro. Adorava patologizar sua condição de cafa e explicar o
quanto era difícil resistir a um cangote, mesmo que o cangote fosse da garota ao
meu lado na festinha do colégio. Era um conquistador de marca maior, apesar das
poucas atribuições físicas. Mas eu queria amor. Resolvi namorar sério com um
cara tranquilão pouco depois de entrar na faculdade. Alguns semestres se
passaram e de volta à solteirice, decidi procurar o ex-skatista (atual barril),
para uma foda amiga. Fail. Apenas sua
convicção de cafa permaneceu impagável. Hoje, passada mais de uma década, me vê
na rua e me canta com o filho recém-nascido no colo. Apresenta a esposa e
depois manda um e-mail falando que sente saudade e me convida para dividir um
litrão no boteco.
Minha última
trepada com o skatista foi a foda fail. Por
essa época, eu estava de asa caída pelo ex-mai cafa ou cafa Hamlet. Esse tipo –
ser ou não ser – é o mais perigoso e irresistível. Avisei sobre os clichês:
malandro, vaidoso, charmoso, gostoso mesmo que não, ardiloso, sacana. Um
filósofo da cafajestagem. Conheci ex-mai cafa em um samba, ele todo sestroso,
eu toda boa bêbada. Mesmo acompanhado por uma bela moça, dançou bem
perto de mim a noite inteira. Na rápida ausência dela, se apresentou e
ensaiamos uns passinhos. Tempos depois nos topamos em um bar e no terceiro
cigarro eu estava destemperada pelas escadas do prédio onde o cafa morava. Já
no apartamento – ‘vai uma taça de vinho?’. Um dia vai e outra noite vem e um
mês e mais. As trepadas eram ora precedidas, ora sucedidas por um papo estranho
e inédito para mim. O cara curtia falar sobre desejo, contar suas façanhas,
discorrer sobre as mulheres que pegava e dava à simples putaria contornos
românticos, etéreos. Era um trabalho de mestre. Eu estava seca pela vadiagem,
mas me deixei enrolar no novelo de ponta dupla – um tesão de matar e essa
conversa mole. Apaixonei no cafa e a proposta de amor livre foi para o beleléu.
Eu queria trepar com só com ele e ponto. Mas as justificativas filosóficas que
o cafa Hamlet tinha para sua necessidade de encontrar outros corpos, confluir o
flerte, deixar jorrar a porra eram tão intelectualmente acessíveis e até,
confesso, excitantes, que cogitei viver essa coisa plural. Mentira, aceitei
nada, eu estava no poço da dependência sexual.
Se tinha uma
coisa que ex-mai cafa odiava era ser chamado de cafajeste. Talvez por isso, em
algum momento, quis ficar comigo e ser fiel. Eu não conseguia disfarçar o fato
de que me chateava com seu talento nato em dar mole para geral. Morria de ciúme
e quando ele vinha com o papo de ser ou não ser eu já queria descer ladeira
abaixo. Mas horas de sexo ininterrupto me faziam esquecer qualquer palhaçada. Uma
boa foda tem um potencial curativo do caralho, literalmente. Só que não dura
mais um gozo. Dois, talvez. Ex-mai cafa era um charme, galante e chupava como
ninguém. Foi, porém, um cafa mal resolvido. Gastou muito tempo explicando seu
caso enquanto deveria só praticar a pegação. Cheguei a pensar que ele fazia
terapia com as minas, todo aquele discurso, sempre querendo conquistar um
coração. O roteiro era o mesmo, não importava a garota. Faltou autenticidade,
sobrou confusão. E faltou que eu me contentasse com apenas uma noite entre uma
donzela e outra, com uma fatia do bolo ao invés de uma sequência de tortas na
cara. Há muito tempo não vejo ex-mai cafa, dizem por aí que é outro cara. Torci
para que tivesse assumido sua cafajestagem. Parece que não.